A propósito de Multidão I - Primeiro
Sinopse
Entramos num ensaio geral, a preparação para um espetáculo que Rui há muito antecipava. O palco seria dele por uns momentos, e conseguia já imaginar a futura interpretação… O som, a música, o silêncio, seriam todos dele, a independência pela qual ele trabalhara durante tanto tempo. A multidão estaria lá para o aplaudir, essa ideia dava-lhe forças para continuar. Mas ele estava nervoso, tão nervoso, nunca tinha feito isto antes, não sozinho. Seria a altura dele brilhar, independentemente do medo que o pudesse assaltar neste preciso momento…
Nuno Cruz, Outubro de 2018
Multidão – I. Primeiro foi uma consequência directa do meu projecto final de Licenciatura na Escola Superior de Música de Lisboa, Contos da Criação: Lilith, uma peça de carácter operático para dois cantores, narrador e pequena orquestra de sopros que escrevi com o Nuno Cruz, na qual o Luís Madureira teve o papel de narrador na sua estreia. Foi algures pela altura em que Lilith estava a ser ensaiada que surgiu a ideia de se escrever um monodrama para um aluno de mestrado do Luís, o Rui Vieira. Logo se juntaram mais dois compositores colegas meus, o Miguel Diniz e o Diogo da Costa Ferreira, sendo que o Nuno Cruz foi convidado pelo próprio Luís a ser o libretista deste projecto.
Tendo ficado a meu cabo o primeiro acto, I. Primeiro, nesta peça explorei a psique do “Rui” (personagem principal que partilha o mesmo nome do cantor) e as suas subpersonalidades que estão presentes neste acto, que são, neste caso, o “Primeiro” e outras subpersonalidades menos desenvolvidas que nunca chegam a ser identificadas. O material musical da peça baseia-se na dualidade entre material de carácter modal e espectral, estando quase sempre apresentados numa forma híbrida.
Foi também nesta peça que escrevi pela primeira vez aquilo que se assemelha tradicionalmente a uma ária, “Ai o mar…”, um poema cantado pelo “Primeiro” que, metaforicamente, expõe o desenrolar do libreto. Embora se encontre relativamente perto do início da peça, este é o momento de maior peso emocional, onde faço uso de um motoric na harpa que depois é expandido nas cordas, sendo que volta a aparecer mais algumas vezes no desenrolar da peça. Momentos antes de esta secção culminar num clímax, faço uso de um acorde baseado na torção da série dos harmónicos de modo a ter características do modo dórico.
Este espectro torcido volta a aparecer mais perto do final da peça, onde é apresentado desta vez com alguns microtons, que são arredondamentos dos parciais desta série dos harmónicos torcida, dando-lhe um carácter mais instável, ilustrando o estado psicológico do Rui que se vai degradando com o desenrolar da peça.
Toda a Ópera
Multidão I - Primeiro
Multidão II - Vera
Multidão III - Aquele