A propósito de Reflectir
Composta em 2015 por João Llano, (Reflectir) é uma peça concebida para voz solo, se bem que possa ser interpretada como uma peça para corpo solo, pois o objectivo é explorar não só a voz, mas também o corpo enquanto instrumento e, ainda, alguns elementos teatrais não convencionais. Esta peça está dividida em dois andamentos. Cada um tem uma duração aproximada de quatro minutos, aproximadamente, o que dará um total de cerca de oito minutos. São ambos de carácter meditativo, apesar de terem aspectos diferentes entre si.
O primeiro andamento é largamente estático, pois a pessoa que o vai interpretar mal sai do palco e limita-se a pronunciar fonemas, que no final do primeiro andamento se vai transformar, lentamente, na palavra reflectir (ainda que de forma imperceptível), a base para esta peça. O segundo andamento já possui mais movimento. O intérprete, que aqui irá cantar o poema, vai percorrer todo o auditório e haverá um momento em que irá mesmo sair da sala. Existem, no entanto, semelhanças. Saltos, palmas são apenas alguns dos elementos presentes em ambos os andamentos. Pode-se dizer que os dois andamentos são semelhantes no que toca ao uso do material, mas são sobretudo distintos no que toca à intervenção da voz e ao movimento do intérprete no palco e no auditório.
Reflectir – Texto reflexivo
(Reflectir) baseia-se no poema homónimo (sem parênteses) de sua autoria. A adição de parênteses no nome da peça veio de forma a transmitir a ideia da importância de segmentos textuais colocados entre parênteses, que têm a intenção de fornecer informação adicional, muitas vezes secundária. A peça é uma interpretação pessoal do poema original, que, entretanto, tem diferenças a nível textual em relação ao mesmo.
Revolve na ideia de reflexão sobre a pessoa, bem como a sua condição enquanto tal. Uma reflexão sobre o seu papel na sociedade, cada vez mais desumanizante e robotizante à medida que o tempo passa. Podemos falar de uma peça que combina uma série vasta de emoções (desde a zanga e a tristeza até à felicidade e à euforia), que não sabemos se é expressada organicamente pela própria pessoa ou se a esta foi impingida por um vasto conjunto de ideias pré-concebidas. Segundo as palavras do autor, reflectir torna simples o complexo, mas é um problema de grande escala: não sabemos o que fazer, nem mesmo dizer por palavras – e, quando tal acontece, um novo pensamento pode, gradual ou repentinamente, surgir do anterior, seja ele complementar ou contrário.
De qualquer das maneiras, dá-se a entender uma peça desconfortante, que espera deixar as pessoas pensar sobre a sua condição enquanto seres humanos, orgânicos, dotados de inteligência natural. Pode-se dizer que esta peça é uma reflexão da reflexão da reflexão: a reflexão na peça acerca da reflexão no poema acerca da reflexão no pensamento.