A propósito de Memória | Okya Flor
MEMÓRIA
Okiya | Flor
Memória descritiva
Ao compor a peça, utilizei uma técnica livre, com algumas nuances. A Harmonia, com um foco menos polar, apoia a melodia da voz, um pouco mais modal, com cromatismos para uma maior tensão até utilizada de encontro com a letra ou a história.
Nesta peça, para me aproximar mais de um mundo oriental, utilizo bastante a escala pentatónica e escalas modais.
Utilizo também sonoridades orientais aproximadas a instrumentos característicos do japão e não os próprios instrumentos por uma questão prática. Exemplos de tal são os gongos, a taça tibetana, a harpa e o interior do piano (para me aproximar à sonoridade de um Koto), e o piano elétrico, acionado como órgão (para me aproximar à sonoridade do Shô).
Utilizo alguns leitmotivs de circunstância, que são repetidos ao longo da peça, mas com ligeiras alterações dependentes do decorrer da ação.
No 1º andamento, utilizo as cordas em harmónicos na área da personagem, para criar uma sonoridade tanto “grotesca” como “instável”, suspensa, enfatizando já as principais características da personagem principal.
No 2º andamento utilizei uma estética mais minimal com ostinatos repetitivos na harpa no modo de ré.
Utilizo a valsa como um elemento sempre conotado ao encontro de um homem com uma mulher, o símbolo da sedução – 3º andamento – Mas lá ocorre a sobreposição de tonalidades, como uma bitonalidade, em que a percussão toca a valsa e as cordas estão em outra harmonia diferente, sendo que a bitonalidade aparece na peça quase como um presságio que algo vai correr mal com aquele amor.
No 4º andamento tentei criar uma sonoridade mesmo típica oriental, com a junção da harpa com a percussão e o piano.
No 5º andamento utilizei uma estética vocal mais repartida por sílabas e não tanto por frase.
No 7º andamento, utilizo a técnica da sobreposição de camadas (tal como no 6º andamento, mas não tão exageradamente), um pouco inspirada na sobreposição de texturas de cantos de pássaros que Messiaen – para a dança da água, no início, ser de uma inspiração Japonesa, uma dança tradicional, que vai descambando, mostrando a verdadeira natureza da Aprendiza no final – um descontrolo e uma loucura.
Relativamente a outras técnicas utilizadas, utilizo a falsa citação – No 8º andamento - criação de um motivo que poderia ter sido escrito no classicismo (como se a personagem quisesse passar um bem estar para o exterior), mas o motivo vai desenrolar-se para uma loucura, desconstruindo-se a ele próprio (para o que a personagem realmente está a sentir). Por conseguinte, a gueixa está associada a um acorde característico, o acorde de 7ª menor (que está nos 6º e 8º andamentos) visto ser a personagem que mais sofre e que mais razões tem para sofrer.
O órgão (shô) é utilizado no 9º andamento. O shô era utilizado nas danças imperiais Japonesas Gagaku, sendo um símbolo de poder. O órgão é o símbolo da morte, o som das igrejas. Pretende ser um presságio para o que vai acontecer a seguir.
Justificação do título
Toda a peça é uma retrospetiva de algo que já se passou, sendo que o coro pretende simbolizar as memórias das personagens. Okiya é o nome dado à casa de Gueixas, e Flor remete a Florbela Espanca, autora dos poemas utilizados para o libreto, e à beleza feminina retratada ao longo da peça.
Data da estreia
20 de Maio de 2018, no Auditório Viana da Motta (ESML).