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“O Pensamento de Si” é um prelúdio orquestral cuja ideia sugere uma reflexão sobre o movimento em torno de si mesmo, ou de retorno a si mesmo, num questionar contínuo da possibilidade do próprio pensamento.

Hugo Vasco Reis

 

Imagem de Fundo
Anabela Becho, “Demasiada Luz Fere (entre o sangue e o fogo), 2013. Série de 21 pinturas sobre papel Fabriano de 350gr, técnica mista, com as dimensões de 70 x 100 cm. Instalação apresentada na Cisterna da Faculdade de Belas Artes, 2013.

“… Cada uma das camadas ocultando subtilmente a anterior, permitindo, por vezes, a revelação da tinta e dos diferentes matizes do negro.”
por Anabela Becho

2010

O Jardim

Inspirado no conto de Rubem Fonseca, “Henri”, o que aqui temos é uma variação desse mesmo conto.
Paris ocupada (1940) e Henry, o homem que não pode escapar a quem é.
O que nele habita não o deixa fugir, mesmo se há uma psicanalista que pode (ou poderia) servir-lhe de espelho redentor.
Sucede que quem mata e faz desse ofício a meticulosa tarefa de mergulhar dentro de si, não pode encontrar redenção.
É Henry, o florista. Ou de certo modo (ou de modo muito muito certo), somos nós todos: por detrás da aparente fragilidade que temos (as flores são essa fragilidade), vive em nós, neste tempo veloz e de rapina, o monstro que habita Henry.
Esta ópera foge, por isso mesmo, às convenções: é sobre uma figura moderna mas esquecida, o serial killer, o homem-monstro que, na sua ocupação diária, prova que estamos longe da humanidade que foi nossa um dia.

2017

Nadir

Esta obra nasceu duas vezes e morreu uma. Uma primeira versão foi iniciada no fim de 2016 que chegou aos 6 minutos até ser completamente amarrotada e deitada ao lixo. No início de 2017 comecei a escrever aquela que viria a ser a ‘verdadeira’ Nadir.

Foi esta morte que me impulsionou a escrever a obra da forma que ela existe agora – 6 minutos de música e meses do maior bloqueio criativo. Mote – usar as fraquezas como armas, usar o sofrimento como ferramenta.

Esta peça, escrita em 2000, marca uma mudança no meu modo de pensar a composição, pois decisivamente, o fenómeno de ressonância passou a ser estruturante na minha escrita. Essa ressonância não é apenas a da sala de concerto mas também a da escrita musical, onde determinados instrumentos assumem essa função na textura. Há ainda que contar com a espacialização da música pela sala de concerto, com os instrumentistas em torno do público, estando 13 clarinetes em palco e 8 (3+3+2) fora do palco, envolvendo o público (nesta versão o clarinete contralto está substituído por um contrafagote).

Formalmente a peça apresenta-se como um ritornello, A, B, A, C, A, D, A, onde o refrão, cada vez que é exposto, aparece modificado. No entanto, neste caso, não é o material motívico que aparece transposto ou variado. Aquilo que se repete é a viagem que o som e o material musical fazem pelo espaço de concerto, tornando essa espacialização estruturante e simultaneamente parte do fenómeno de ressonância que se estende, além dos fenómenos acústicos, para a ressonância dos próprios gestos musicais.

Este projecto surgiu da vontade em executar uma obra para contratenor diferente do repertório praticado habitualmente por este tipo de voz. Ao longo da investigação realizada com esse objectivo, constatámos a diminuta produção de obras contemporâneas de autores portugueses – as únicas com que nos cruzámos escritas especificamente para contratenor foram a ópera “Das Märchen” de Emmanuel Nunes, estreada no Teatro Nacional de São Carlos a 25 de Janeiro de 2008, em que a personagem Fogo-Fátuo foi interpretada pelo cantor de origem inglesa Andrew Watts, e a ópera “Os Dias Levantados” de António Pinho Vargas, estreada nesse teatro a 25 de Abril de 1998, com o cantor Nicolau Domingues na interpretação de Anjo. Assim, foi feito um convite a compositores do departamento de composição da Escola Superior de Música de Lisboa para escreverem uma obra com este fim. Pedro Finisterra, Miguel Diniz e Diogo da Costa Ferreira responderam ao desafio, aos quais se juntou o escritor Nuno Cruz, colaborador habitual de Pedro Finisterra, que escreveu o libreto. A história fala-nos de Rui, um rapaz com problemas de esquizofrenia e múltiplas personalidades, e do seu percurso pela vida em convívio com as várias “vozes” que tem dentro de si. Dessas vozes destacam-se três, exploradas pelos compositores em cada uma das três partes do libreto: Pedro Finisterra em “Primeiro”, Miguel Diniz em “Vera” e Diogo da Costa Ferreira em “Aquele”. Com este projecto pretende-se estimular a criação de obras para voz de contratenor, enriquecendo o repertório que habitualmente se costuma interpretar.

Rui Vieira, Outubro de 2018

Entre o sono e o sonho,
Entre mim e o que em mim
É o quem eu me suponho
Corre um rio sem fim.

Passou por outras margens,
Diversas mais além,
Naquelas várias viagens
Que todo o rio tem.

Chegou onde hoje habito
A casa que hoje sou.
Passa, se eu me medito;
Se desperto, passou.

E quem me sinto e morre
No que me liga a mim
Dorme onde o rio corre —
Esse rio sem fim.

Fernando Pessoa, in “Cancioneiro”

Catarina Bispo

Evento/Concerto/Projecto Semana da Composição 2015
2015

Double

«Double» (2015) é uma peça composta para dois percussionistas brilhantes, Miguel Ferreira e Tomás Moital, para os quatro percussionistas que os acompanham e muito especialmente para a Orquestra de Sopros da Escola Superior de Música de Lisboa, no ano do seu 10º aniversário. O seu nome deve-se à natureza compósita dos seus solistas, que contagia os percussionistas da orquestra e todos os seus elementos, num jogo de espelhos de resultados imprevisíveis.

Depois de um primeiro momento, em que, como resultado do seu contracenar, vemos aparecer uma alternância entre secções mais estáticas e secções mais dinâmicas, surge uma secção calmíssima, sugerindo, por fim, um momento de sã convivência. Este momento é, no entanto, bruscamente interrompido por uma coda, em que os dois solistas reavivam a orquestra.

Esta peça é dedicada ao maestro Alberto Roque, pela muita estima e admiração que o seu trabalho me merece.

João Madureira

Ditados da Consciência é uma obra de cariz minimal repetitiva. Numa alusão à insistência da consciência de uma pessoa, ou de quase todas as pessoas, esta peça procura indagar, de um modo subjectivo, a dicotomia entre motivos verdadeiramente repetitivos, quais uma consciência um tanto ‘robótica’ do zeitgeist em que vivemos, e a idiossincrasia de um ser humano revelada por motivos ou frases melódicas, que se sobrepõem, ou não, a esse contínuo ascendente social, ou moral, sobre a individualidade que define cada um de nós.

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